Conto da Praga - Parte 1
Excelente conto do nosso escritor Evandro Almeida, que queremos compartilhar com nossos leitores, esse conto tem sequência e você poderá ler na página do Facebook do autor: https://www.facebook.com/RPGdaVidaReal/
BOA LEITURA!!
BOA LEITURA!!
Contos da Praga - parte 1
Evandro Almeida
(Música
de ambientação nos comentários: Final Fantasy Tactics - Unavoidable Battle
Extended)
Tinha
perdido minha vontade de escrever. Parecia que minha inspiração tinha
enfraquecido até há pouco e eis que se renova imensamente!
Fazem
23 dias desde que a praga foi anunciada no Império, desde então a minha vida
ficou de pernas pro ar pois como clérigo da Fortaleza e amigo próximo do
regente, fui incumbido de estudar a situação e fazer frente contra o que estava
por vir.
Assim,
à medida que aprofundava e acelerava os meus estudos, o desespero tomava conta
de mim! Rogo inúmeros impropérios contra a Fortuna, essa meretriz amaldiçoada e
trocista do destino daqueles que vivem! Que os gritos dos desafortunado
degenerem a tua audição, Deusa Auspiciadora! Por tua causa, não durmo direito
pensando em como combater esse mal, Prostituta-Mor! Como eu vou montar as
defesas, Cortesã Divina? Por favor, que Vossa Messalinidade ajude-me então e
mostre-me de que forma a Ordem está recomendando fazer as estratégias? Divina
Perversidade, o que dizem os antigos escritos? Conte-me Afamada Dama como os
outros reinos reagiram? Deusa Marafona são tantos questionamentos, tantas
dúvidas! Tu, a Infiel Madame deixaste-me perdido, procurando um caminho… e
tantos dependem de mim…
Ah!
Futuro leitor e tu? Como estarás quando leres o meu escrito? Que mundo
encontrarás? Poderás dizer-me se terei feito bem o meu papel? Saibas que vivo
cada dia com intensidade jamais vivida anteriormente e retomei a capacidade de
sentir o Tempo passar lentamente, pois sim, tenho medo de perder a minha
essência e minha vida com esta Praga, saibas tu! Ela se mostra tão mortífera,
tão sorrateira, injusta e desumana! É um oponente digno de se enfrentar!
Quero
que saibas, nobre leitor que certo dia fiz a leitura num manuscrito em outro
idioma, descrevendo como a Morte era carregada por esse agente pestilífero.
Descrevo-te: É insano. Compreendas tu o que te represento por escrito agora: o
doente perde a capacidade de respirar em poucos dias, sofrendo um fim
angustiante e doloroso indescritível. Entendas, nossos métodos se mostram
incapazes de fazer frente. Essa Imunda Maldição é veloz e sofre de uma
glutonice digna de um camelo sedento por novas almas, dizem que vários doentes
chegam aos monastérios aos montes, incalculáveis, assustando quem está na linha
de frente e os sobrepujando. Informo-te que eles sofrem como peixes fora do rio
e causam uma imagem retorcida, irreal, indigna e desumana, levando vários
combatentes a loucura e insanidade. É recomendado que seus corpos sem vida,
após o falecimento, devem ser descartados com extrema rapidez, pois é sabido
que são fonte de nova contaminação. Assim sendo, nos outros continentes, valas
comuns e fogueiras foram construídas para dar conta de demanda funerária. Ah,
Infame Senhora! A tua morada deve estar abarrotada de espíritos vagando sem a
justa Classificação! Que te afogues e te entupas com as almas daqueles que
caíram com a tua Palavra Profana, Desumana! Eu te amaldiçoo mil vezes dez mil
vezes!
Amigo
e futuro legente, perceba que movido pelo impulso de se fazer valer o
Conhecimento nesse instante sombrio, e convocado para confrontar esse Mal
Infame, tive que separar-me de minha família. Saibas tu e declaro a ti: a
distância me consome! É doloroso e difícil de ser descrito o que sinto pois é
extremamente fora do comum: eu queria tanto abraçar os meus pais e parentes mais
velhos, mas tenho medo de ser o portador dessa Imunda Desgraça! Informo-te que
minha esposa e filhas começaram a se habituar com nova vida e novos costumes.
Fazemos uso de emolientes de cor azulada e outras substâncias incolores para
evitar o contágio (tem funcionado até esse momento!), máscaras de tecido local
fazem parte de nosso vestuário e já estou habituado com as vestes de um
velhaco! Também não realizamos os devidos cumprimentos que faziam parte de
nosso ritual costumeiro de hospitalidade, nossa alimentação mudou, nossas
prioridades, também - queremos sobreviver e nada mais.
Conto-te
nobre amigo que nutro profunda admiração que o meu irmão também é frequentador
da Ordem Monástica. Ele quer muito ser Paladino. Confesso-te também que tenho
muito medo de perdê-lo. Paladinos são os primeiros a cair na linha de frente
contra a Peste (e o que direi aos meus pais?). Para evitar a contaminação ele
se distanciou de sua noiva, mandando-a a casa dos pais, mesmo contra a vontade
dela. Só que nesse ínterim, ela é voto vencido: minha sobrinha se encontra no
ventre dela e é motivo de força maior. Não podemos arriscar. Maldita Peste, tu
estarás com tua forma putrefada quando minha parente nascer? Vieste tu nos
atormentar Desgraça, logo agora que os dois iriam frequentar um novo recanto?
Ah como eu te odeio “Divina Providência”!
E
nos dias que se seguiram, contra os sacrifícios realizados, encontramo-nos
diversas vezes eu e meu irmão. Estudamos diversas formas de fazer barreiras
contra essa Doença, até que o agente da Peste deu as caras em nossa Fortaleza -
como essa Maldição Praga é rápida! Pegou um jovem mancebo e mercador local que
trouxe de outras terras, em seu corpo, o Agente da Desgraça. Imediatamente
colocamos o infectado em vigília rigorosa para evitar o contágio desenfreado,
fiscalizamos seus contatos: 111 pessoas! Fortuna, sua Biltre, isso muito
trabalho, mas vou encarar o desafio! Um pandemônio era certo, daqueles
descritos em antigas obras clássicas, mas decidi subjugá-lo!
Saibas
tu, eloquente leitor que esse evento foi o estopim de um enorme furor na
população local. É certo e tenha ciência disso: todos querem viver e dariam
tudo para conseguir a garantia de que toda a ordem seria mantida. Assim
ocorreu: ruas desertas, mercados vazios, todos se esconderam em suas casas.
Fato positivo que isso nos deu tempo de resposta, mais estudos eram
necessários! Eu e meu irmão conjecturávamos acerca do problema ao sermos
convocados pelo regente e seu comandante a dar respostas de enfrentamento
contra a Praga. O que se seguiu, foi estupendo de presenciar, uma mudança da
ordem e um exemplo do uso do Poder a favor dos mais desafortunados e
abandonados! Naquele instante eu acreditei que todo esforço seria feito para a
manutenção da vida e da organização social! Todo o sacrifício era essencial.
Cada ato era uma existência que a Injusta Deusa não tiraria de nosso convívio.
Nos
momentos seguintes, os mercadores foram chamados, a nobreza convocada e o
proletariado recebeu os devidos anúncios. Nova ordem, novas direções. Era como
se timoneiro colocasse suas mãos e forçasse o leme em rota contrária ao destino
que o barco estava indo, uma esperança nascia no meu peito. Planos e
estratégias eram construídos com enorme rapidez, ampliação do Monastério, novas
técnicas de enfrentamento, barricadas, abordagem contínua e sistemática dos
viajantes. Eu acreditei: poderíamos fazer frente e sair vitoriosos! Nossas
chances aumentavam! Eu conseguia vislumbrar um novo futuro de união e
reconstrução de nossa sociedade, sairíamos mais fortes desse embate, com toda a
certeza! Tua derrota era nossa certeza, Imunda Meretriz Divina!
Inundado
de expectativa, diferente de outros tempos, eu me dispus a ir para a linha de
frente e orgulhoso fiquei de estar braço a braço com meu irmão. Compreenda
amigo ledor que, sem arrependimentos faria tudo de novo! Coloquei-me a
disposição para ser a inspiração que elevaria a moral combalida de nossa Ordem
e faria uma digna resistência contra a Indigna Doença. Conduziria também o leme
desse barco, eu faria a História! Tornei-me assim um usuário das Proteções
Especiais Individuais - uma armadura diferenciada de tudo o que já tinha feito
uso anteriormente. Realizo desde então um ritual exaustivo e pormenorizado de
materiais sobrepostos para evitar o contato contra o agente pestilífero. Sempre
no final dos dias de intenso trabalho que se seguiram, encontrava-me
constantemente suado, cansado, faminto e desidratado. O elmo é sempre
sufocante, causa-me claustrofobia e machuca-me a face. O peso da armadura,
desconfortável e impermeável. Os guantes são estranhos e fazem minha pele se
arruinar. No entanto é um mal necessário, não posso cair agora - muitos
precisam de mim!
Descrevo-te
leal amigo que os rostos dos doentes levam a marca do pânico e apertam-me o
coração. Faço de tudo para dizer-lhes que ficarão bem, mesmo enxergando, dentro
de seus olhares o sinal da Praga. Por vezes, o ar que a Doença lhes rouba
sempre me sobressalta e assusta, causando-me a sensação de impotência - não
possuo magia curativa, nem remédios para abrandar seu desconforto! Apenas
palavras e só.
Como
eu te difamo Deusa Profana!
É
certo o comentário que os primeiros dias de mobilização se seguiram foram bem
conduzidos. Mesmo atrapalhados, conseguimos uma boa resposta nesse cenário de
guerra infausta. Ou assim cria eu, pois mal saberia o que surgia nos últimos
dias antes de escrever esse meu testemunho.
Meu
irmão, sábio e sagaz, disse certa vez: “O que governa o mundo é o que brilha
mais.” E leitor, o ouro sempre reluziu muito e fora o alvo predileto de todas
as rotas comerciais. Por favor some-se a isso o fato de nunca presenciarmos
algo parecido antes. Entenda: das pessoas que um dia já viveram tal feito, hoje
elas não existem mais. Essa Peste não se comporta como desejamos, é
imprevisível. No meu afã de resolver tudo rapidamente, eu esqueci que na
verdade, o combate verdadeiro nem se iniciou ainda.
E
para piorar tudo, a insanidade de Nossa Maiestatis Imperial está arruinando a
cada dia: o Imperador não acredita na potência destrutiva da Doença e nem faz
menção de fazer o devido auxílio, indo contra o que todas as nações estão fazendo!
Nós precisamos das armas e armaduras especiais! Elas são dispendiosas e
difíceis de manufaturar, nunca conseguiremos fazer uma resistência mínima sem a
devida ajuda imperial! Os portadores do poder econômico começaram a reclamar (e
não é sem razão, eu sei!) e fazem eco dos ditos de nosso governante-mor, ao
arrepio do que fala o Conhecimento descrito!
Considere
isso, nobre legente: eu quero ser a voz que guiará a luta, mas estou ficando
impotente e fraco nos últimos dias! Minha fé durou tão pouco! A desesperança
começou a corromper, lentamente, o meu peito - isso seria também efeito da
Praga? Talvez. O que farei nos próximos dias? Devo não desanimar, a batalha nem
se iniciou ainda! Confesso que tenho medo de acabar minha existência
precocemente, mas não posso me acovardar!
Vou
repousar, amanhã é novo dia incerto e quero fazer frente contra ti, Profana
Dama! Que um dia a tua essência desvaneça no véu da Realidade e que te impales
com essa demoníaca Vontade que deste o nome de Nova Peste! Porca Divina eu te
odeio tanto! Quero que essa emoção me impulsione e me dê ânimo e for/ça novos.
Farei frente, isso é certo!
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